Criada há 48 anos, a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan)
abastece de água 320 dos 497 municípios gaúchos, ou quase dois terços do
total, atendendo 6,6 milhões de habitantes ou 55% da população. Esses
números robustos dão à empresa do governo do Estado a primazia no setor,
mas recentemente novos atores entraram em cena – empresas da iniciativa
privada – levando à necessidade de se refletir sobre as adequações de
cada modelo.
O presidente da Corsan, Tarcísio Zimmermann, diz que nos últimos
cinco anos aumentou o número de cidades atendidas pela companhia, mas
locais importantes, como Uruguaiana e São Gabriel, saíram do sistema,
passando para empresas privadas. Zimmermann ressalta que as empresas da
iniciativa privada só querem atender as cidades de médio a grande porte.
As de pequeno porte são deficitárias e ficam com a Corsan, que cumpre o
seu papel social. Ele afirma que até 2017, a Companhia deverá investir
R$ 500 milhões na melhoria do abastecimento de água.
Na cidade da fronteira com a Argentina, a empresa Foz, pertencente ao
grupo Odebrecht Ambiental, que assumiu em 2011, informa ter passado de
89% para 97,8% o percentual de uruguaianenses servidos com água tratada,
ou seja, um universo de 10 mil moradores a mais. “Foram investimentos
que ultrapassaram R$ 13 milhões só em abastecimento de água; realizamos
mais de 8 mil metros de ampliação de redes de água e melhoramos o
sistema de abastecimento com novos registros, conexões e bombas”, afirma
a empresa Foz, em nota por e-mail.
As diferentes formas de gestão não impediram que, no final de 2013,
diversos municípios sofressem com a falta de água, em razão das
temperaturas muito altas, o que puxou fortemente o consumo. O apagão
atingiu, indistintamente, cidades da Corsan, de empresas municipais ou
da iniciativa privada. Uruguaiana foi uma delas. “O que acontece em
bairros que ainda não receberam os investimentos é a baixa pressão de
água. Algumas redes têm mais de 40 anos na cidade e estão propensas a
obstrução, ocasionando esta baixa de pressão”, informa a Foz.
Em Pelotas, atendida pelo Sanep – Serviço Autônomo de Saneamento,
autarquia municipal, igualmente as torneiras permaneceram secas, no
final do ano, especialmente na praia do Laranjal, o que foi atribuído à
falta de energia, a qual afetou uma estação de tratamento de água.
Santana do Livramento, onde raramente ocorrem problemas desse tipo,
também enfrentou falta de água, precisando recorrer a caminhões-tanque
chamados pelo DAE- Departamento de Água e Esgoto. A justificativa foi a
redução dos níveis do lençol freático, baixando, em consequência, a
capacidade dos reservatórios. Curiosamente, um caminhão-pipa foi
emprestado de Bagé (lá o serviço é municipalizado), onde historicamente
falta água e há racionamento, mas que neste verão escapou dos problemas,
pois o índice de chuva tem sido satisfatório. Bagé, a propósito, só se
livrará do fantasma do desabastecimento com a construção da barragem de
Arvorezinha, que atualmente está parada.
Cenário desafiador
Mesmo com a concorrência de empresas privadas e municipais, a Corsan
registra crescimento anual de 5% de novas ligações – atualmente são 2,45
milhões de economias ligadas ao sistema, informa o presidente Tarcísio
Zimmermann. “É um número desafiador. Não é fácil prover todos os anos o
abastecimento com um crescimento desta proporção, que exige grande
esforço de planejamento e investimento. Operamos 130 mil quilômetros de
rede de água, e sempre pode haver algum problema técnico que atrapalhe o
abastecimento”, acrescenta.
Mesmo considerando o Rio Grande do Sul o estado com o maior volume de
recursos hídricos, Zimmermann comenta que há pontos críticos. Um deles é
a existência de inúmeros loteamentos irregulares, principalmente nas
grandes cidades, onde não há redes de água ou elas são clandestinas.
“São os primeiros lugares onde falta água e onde ela demora a voltar”,
diz. Há cidades da Região Metropolitana onde Corsan consegue cobrar 40%
da água que produz, “o resto é clandestino ou perdido”.
E, mesmo com o manancial farto, em rios e lagoas, a distribuição no
Estado “não é muito justa”, diz Zimmermann, o que acarreta problemas de
captação nas regiões do Planalto Central, Campanha e Noroeste. “Mas a
maior dificuldade ocorre na Região Metropolitana, no Rio dos Sinos e no
Gravataí, muito poluídos e com regimes instáveis, o que eleva o custo do
abastecimento e afeta a qualidade da água, a qual precisa de muito
tratamento para se tornar potável”.
Nesta segunda-feira (20), a Corsan inaugurou uma nova adutora de água
bruta em Gravataí. O investimento da Companhia, com recursos próprios,
foi de R$ 1,8 milhão, elevando a produção de água para 645 litros por
segundo. Segundo Zimmermann, esta obra torna menor o risco de falta de
água. “A nova adutora – disse ele na inauguração – integra um conjunto
de ações que a Corsan está fazendo para melhorar o sistema de
abastecimento de Gravataí”. E assegurou: “em março, com a instalação de
novos equipamentos eletromecânicos, a produção de água saltará para 700
litros por segundo”.
Gravataí também deverá ganhar uma nova adutora de água tratada, que
beneficiará mais de cinco mil economias de bairros próximo ao Complexo
Industrial Automotivo da General Motors e a própria GM.
Quem paga a conta
Das 320 cidades que atende, a Corsan obtém resultado operacional
positivo em apenas 45; do total, 170 cidades são deficitárias. “Essas
são mantidas porque a empresa é pública”, esclarece Zimmermann,
acrescentando que os municípios com maiores receitas acabam sustentando
os pequenos. Segundo ele, grandes empresas públicas de saneamento do
país, como a Sabesp, de São Paulo, abastecem também a capital e a região
metropolitana, e por isso têm um ganho de escala grande. Isso não
acontece no Rio Grande do Sul, onde o abastecimento de Porto Alegre é
municipalizado (pelo DMAE).
“As empresas privadas só querem cidades de porte médio, que dão
lucro; se a Corsan perder essas cidades, como vamos sustentar
pequenas?”, questiona Zimmermann, dizendo que a situação “inspira
cuidados, mas não é de risco”. Outra conta que deve ser fechada, segundo
ele, é a indenização a ser paga à Corsan nos locais onde a gestão foi
municipalizada ou privatizada, por conta dos investimentos
(equipamentos, prédios etc) que a empresa pública tinha nessas cidades.
Até 2017, a Corsan deverá investir R$ 500 milhões para melhorar
abastecimento de água no Estado, especialmente na Região Metropolitana.
As verbas vêm do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e já estão
garantidas. São recursos históricos, especialmente o montante de R$3,9
bilhões serão destinados a ampliar a rede de esgotos de 15% para 37% no
Estado. Quanto aos modelos de gestão futuros, Zimmermann afirma: “é
muito recente a presença da iniciativa privada, exemplos de Uruguaiana e
São Gabriel, e por isso não se pode dizer como vai repercutir. No
mundo, a França privatizou e depois reestatizou a água, por achar que
aquele modelo não tinha dado resultado. Nosso entendimento é de que a
água é um bem público e a Corsan, uma empresa com visão social”.
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